"Isto vai enviar uma mensagem aos membros dos cartéis de droga. Não há clemência para os traficantes"
"Nem quero acreditar que vão colocar-me uma venda e, sem injeções nem nada, fuzilar-me até à morte, não acredito que a minha vida termine dessa maneira dramática". Marco Archer pediu clemência, mas foi recusada.
A Indonésia anunciou que vai executar por fuzilamento nos próximos dias seis condenados por tráfico de drogas. Dos seis, quatro são estrangeiros e um destes é o brasileiro Marco Archer Cardoso Moreira, de 53 anos.
O caso está a mobilizar a presidente Dilma Rousseff, o Ministério dos Negócios Estrangeiros do Brasil e a secção brasileira da Amnistia Internacional. Amigos de Marco Archer nas redes sociais fazem um último apelo às autoridades indonésias. (Veja imagens da última visita da família)
"Por favor, divulgue o vídeo que colocámos no Facebook", pediu ao DN Marcos Prado, produtor dos filmes Tropa de Elite e Tropa de Elite 2 e amigo pessoal do condenado.
"Cometi um erro gravíssimo, já pedi perdão às autoridades pelo meu erro e vou tentar até ao fim, sonho em voltar ao Brasil e explicar aos jovens que a droga só tem dois caminhos, a prisão ou a morte, nem quero acreditar que vão colocar-me uma venda e, sem injeções nem nada, fuzilar-me até à morte, não acredito que a minha vida termine dessa maneira dramática numa prisão na Indonésia", diz o condenado no vídeo de cerca de dois minutos e meio.
Fontes do Planalto citadas pela imprensa brasileira referem que, sendo ambos os países membros do G20, grupo das 20 maiores economias do mundo, e mantendo um intercâmbio comercial de 4 mil milhões de dólares, a diplomacia do Brasil esperava mais "cortesia".
Em declarações ao DN, Átila Roque, diretor da Amnistia Internacional do Brasil, repudiou a situação. "Somos contra a pena de morte em qualquer circunstância, um procedimento que desumaniza o Estado que a executa, mas ainda mais num crime como o tráfico de droga, que a legislação internacional não considera muito grave nem violento." Roque acrescenta ainda: "Lamentamos que a vida destes cidadãos sirva para a propaganda política do presidente indonésio."
Widodo, presidente desde outubro de 2014, prometeu em campanha eleitoral tolerância zero contra o tráfico de droga, ao contrário do antecessor Susilo Yudhoyono, ganhando apoio da maioria da população. Defende Widodo que o tráfico de drogas prejudica as gerações futuras.
Neste momento, a Indonésia tem 138 presos no corredor da morte - cerca de um terço são estrangeiros, entre eles mais um brasileiro, Rodrigo Gularte, também detido por transportar droga dentro de pranchas de surf, dois cidadãos australianos, um malauita e outros de nacionalidade desconhecida. Há duas mulheres, uma indonésia e uma vietnamita, também nessa situação. Desde 2001, 27 pessoas foram executadas. O último fuzilamento, de cinco condenados, ocorreu em 2013.
Archer está detido desde agosto de 2004, quando tentava entrar no país com 13,4 quilos de cocaína escondidos nos tubos de uma asa-delta. Condenado à morte, teve direito pela lei indonésia a dois pedidos de clemência, ambos negados.
Na quarta-feira foi levado da prisão onde estava, em Pasir Putih, a 400 quilómetros de Jacarta, para outra unidade, em Nusa Kambangan, procedimento normal antes das execuções iminentes. "Ele ficou muito assustado e chocado porque pensou que fosse executado logo nessa hora", contou Utomo Karim, o advogado indonésio pago pelo governo brasileiro que defende Archer.
Num primeiro momento, a execução foi marcada e posteriormente adiada, sem explicação. Supõe-se que o adiamento se deveu à necessidade de esperar que as famílias dos condenados cheguem.
No caso de Archer, cujos pais já faleceram, é solteiro e não tem filhos, é aguardada a qualquer instante uma tia, que partiu do Rio de Janeiro na quarta-feira. Na viagem para Jacarta, a parente faria duas escalas, uma delas em Lisboa. Por esse motivo, foi divulgado que o condenado lhe pediu um bacalhau, comprado na capital portuguesa, como último desejo.
O procurador-geral, Praseyto, disse que cinco dos reclusos foram transferidos para a prisão de Nusakambangan e um sexto prisioneiro para a prisão de Boyolali, ambas na ilha de Java, onde as sentenças deverão ser executadas às 00:00 de domingo (17:00 de hoje em Lisboa), informou o diário Kompas, citado pela Efe.
Praseyto acrescentou que foram preparados seis pelotões de fuzilamento e a atenção religiosa para cada um dos condenados de acordo com as suas crenças.
Também informou que a 30 de dezembro foram rejeitados os pedidos de clemência para os seis condenados -um indonésio, um brasileiro, um holandês, dois nigerianos e um vietnamita - todos eles por tráfico de droga.
"Isto vai enviar uma mensagem aos membros dos cartéis de droga. Não há clemência para os traficantes", disse o procurador-geral.
Estas vão são as primeiras de 20 execuções que as autoridades indonésias planeiam executar este ano depois de em 2014 não terem executado nenhum condenado.
A Presidente do Brasil, Dilma Rousseff, telefonou na sexta-feira ao seu homólogo indonésio, Joko Widodo, para pedir pela vida de Marco Archer Cardoso Moreira, de 53 anos, detido em 2003 no aeroporto de Jacarta, quando tentava entrar no país com 13,4 quilos de cocaína.
Widodo, que insistiu que não perdoaria as condenações à morte por delitos relacionados com o tráfico de droga, respondeu que "não poderia comutar a sentença" uma vez que tinham sido cumpridos todos os trâmites legais.
A Amnistia Internacional (AI) pediu uma moratória da pena de morte a Widodo, que tomou posse em outubro e tem sido considerado por muitos ativistas como uma esperança de mudança no país.
"O novo Governo da Indonésia entrou em funções com a promessa de melhorar o respeito pelos direitos humanos, mas proceder a estas execuções seria um movimento regressivo", disse o diretor da Amnistia Internacional na Ásia, Rupert Abbott.
Uma dezena de organizações locais enviou uma carta ao Presidente da Indonésia, também a pedir para adiar as execuções.
Um dos signatários, o fundador da organização Fortalecimento e Ação para a Justiça, Rudhy Wedhasmara, disse que a solução para o tráfico de drogas não é a pena de morte, cujas vítimas, segundo ele, são as pessoas numa posição fraca e vulnerável, e não os chefes de redes de tráfico.
"O Estado não deve colocar o fardo de seu fracasso na luta contra as drogas na pena de morte", disse Wedhasmara, segundo o jornal Kompas.